O Discurso de Ledo e o Dia do Maçom
Abaixo, transcrevo o famoso discurso do Irmão Joaquim Gonçalves Ledo, realizado na 14ª Sessão – Assembléia do GOB, no 20° dia do 6° mês, quando, na oportunidade, como Primeiro Grande Vigilante, exerceu mais uma vez o Grão-Mestrado no impedimento do Grão-Mestre José Bonifácio.
“SENHOR! A natureza, a razão e a humanidade, esse feixe indissolúvel e sagrado, que nenhuma força humana pode quebrar, gravaram, no coração do homem, uma propensão irresistível para, por todos os meios e com todas as forças em todas as épocas e em todos os lugares, buscarem ou melhorarem o seu bem estar. Este principio tão santo como a sua origem, e de centuplicada força, quando aplicado às nações, era de sobra para o Brasil, essa porção preciosa do globo habitado, não aceder à inerte expectação de sua futura sorte, tal qual fosse decretada longe de seus lugares e no meio de uma potência (Portugal), que deveria reconhecer inimiga de sua glória, zelosa de sua grandeza, e que bastante deixava ver, pelo seu Manifesto às nações, que queria firmar a sua ressurreição política sobre a morte do nascente Império Luso-Brasileiro, pois baseava as razões de sua decadência sobre a elevação gloriosa desse filho da América – o Brasil. Se, a esta tão óbvia e justa consideração, quisesse juntar a sua dolorosa experiência de trezentos e oito anos, em que o Brasil só existira para Portugal, para pagar tributos, que motivos não encontraria na cadeia tenebrosa de seus males, para chamar a atenção e vigilância de todos os seus filhos a usar da soberania, que lhe compete, e dos mesmos direitos, de que usara Portugal, e por si mesmo tratar de sua existência e representação política, da sua prosperidade e da sua constituição? Sim, o Brasil podia dizer a Portugal: “Desde que o sol abriu o seu túmulo e dele me fez saltar, para apresentar-se ao ditoso Cabral a minha fertilidade, a minha riqueza, a minha prosperidade, tudo te sacrifiquei, tudo te dei, e tu que me deste? Escravidão e só escravidão. Cavavam o seio das montanhas, penetravam o centro do meu solo, para te mandarem o ouro, com que pagavas às nações estrangeiras a tua conservação, e as obras, com que decoras a tua majestosa capital; e tu, quando a sôfrega ambição devorou os tesouros, que, sob mão, achavam-se nos meus terrenos, quiseste impor-me o mais odioso dos tributos, a “capitação”. Mudavam o curso dos meus caudalosos rios, para arrancarem de seus leitos os diamantes que brilham na coroa do monarca; despiam as minhas florestas, para enriquecerem a tua grandeza, que, todavia, deixava cair das enfraquecidas mãos... E tu que deste? Opressão e vilipêndio! Mandavas queimar os filatórios e teares, onde minha nascente indústria beneficiava o algodão, para vestir os meus filhos; negavas-me a luz das ciências, para que não pudesse conhecer os meus direitos nem figurar entre os povos cultos; acanhavas a minha indústria, para me conservares na mais triste dependência da tua; desejavas, até, diminuir as fontes da minha natural grandeza e não querias que eu conhecesse o Universo, senão o pequeno terreno, que tu ocupas. Eu acolhi no meu seio os teus filhos, a cuja existência doirava, e tu me mandavas em pagos tiranos indomáveis, que me laceravam.
Agora, é tempo de reempossar-me de minha Liberdade; basta de oferecer-me em sacrifício às tuas interessadas vistas. Assaz te conheci, demasiado te servi... – os povos não são propriedade de ninguém. Talvez, o Congresso de Lisboa, no devaneio de sua fúria (e será uma nova inconseqüência), dê o nome rebelião ao passo heróico das províncias do Brasil à reassunção de sua soberania desprezada; mas, se o fizer, deverá primeiro, declarar rebelde a Razão, que prescreve aos homens não se deixarem esmagar pelos outros homens, deverá declarar rebelde a Natureza, que ensinou aos filhos a se separarem dos seus pais, quando tocam a época de sua virilidade; é mister declarar rebelde a Justiça, que não autoriza usurpação, nem perfídias; é mister declarar rebelde o próprio Portugal, que encetou a marcha de sua monarquia, separando-se de Castela; é mister declarar-se rebelde a si mesmo (esse Congresso), porque, se a força irresistível das coisas prometia a futura desunião dos dois Reinos, os seus procedimentos aceleraram essa época, sem dúvida fatal para outra parte da nação que se queira engrandecer.
O Brasil, elevado à categoria de Reino, reconhecido por todas as potências e com todas as formalidades, que fazem o direito público na Europa, tem inquestionavelmente jus de reempossar-se da porção de soberania que lhe compete, porque o estabelecimento da ordem constitucional é negócio privativo de cada povo.
A independência, Senhor, no sentido dos mais abalizados políticos, é inata nas colônias, como a separação das famílias o é na Humanidade.
A natureza não formou satélites maiores que os seus planetas. A América deve pertencer à America, e Europa a Europa, porque não debalde o Grande Arquiteto do Universo meteu entre elas o espaço imenso que as separa. O momento, para estabelecer-se um perdurável sistema e ligar todas as partes do nosso grande todo, é este... O Brasil, no meio das nações independentes, e que falam com exemplo de felicidade, não pode conservar-se colonialmente sujeito a uma nação remota e pequena, sem forças para defendê-lo e, ainda, para conquistá-lo. As nações do Universo têm os olhos sobre nós, brasileiros, e sobre ti, Príncipe!
Cumpre aparecer entre elas como rebeldes, ou como homens livres e dignos de o ser. Tu já conheces os bens e os males que te esperam e à tua posteridade. Queres ou não queres?
Resolve Senhor!”
Cabe salientar que as datas, em que foram realizadas as Sessões do GOB, em seus primórdios, vêm criando inúmeras confusões graças à falsa interpretação do Barão do Rio Branco, em notas de “História da Independência do Brasil”, de Varnhagen, copiando Manoel Joaquim de Menezes, em um erro largamente divulgado, através de diversos compiladores, o que gerou inúmeras controvérsias, inclusive, sobre a data de fundação do GOB, devido à confusão do calendário, utilizado na época: o hebraico (iniciado em 21 de março), utilizado pelo Rito Adonhiramita. A data, em que foi proferido esse fervoroso discurso de Ledo, foi sugerida e aprovada como o Dia do Maçom, na 5ª Reunião da CMSB, realizada em Belém/PA, em 1957, por sugestão da GLMMG, baseando-se na falsa interpretação do Barão do Rio Branco. Por isso, comemoramos o Dia do Maçom em 20 de agosto, quando, na verdade, esse discurso foi proferido no 20º dia do 6º mês (Elul), o que nos remete à data de 09 de setembro. Em verdade, esse dia deve ser comemorado pelos verdadeiros Maçons todos os dias, através de uma postura altruística, a exemplo de nossos Irmãos do passado que se souberam impor e derrubar as Bastilhas, assoladoras da sociedade brasileira. Muitas Bastilhas, ainda, existem, e precisamos, urgentemente, derrubá-las. Ressuscitemos nosso saudoso Irmão Ledo dentro de nós, através de uma conduta digna de um verdadeiro Maçom. A sociedade exige uma Maçonaria mais atuante. Por que não quebrarmos essa quase inércia desde já, aproveitando esse ano eleitoral?
Feliz Dia do Maçom!
Ruy Luiz Ramires.'.