Maçonaria é Vida
Era tarde, bem tarde, noite adentro. O telefone tocou.
Sonolentamente ergo o fone. Do outro lado da linha uma voz suave e meiga.
- Alou?...É da residência do Doutor....?
- Sim....!
- Desculpe-me ligar a esta hora, mas.... É o Doutor quem está falando?
- Sim, minha senhora. Pode falar! (Entonação da voz suave suplicante).
- Doutor, a minha mãe não está passando bem. Ela já é muito idosa e não tem condições de se locomover. O senhor poderia vir atendê-la em casa?
É urgente, doutor.
- Sim, minha senhora. Dê-me o endereço.
- Rua tal, nº tal; aqui mesmo no bairro.
- O senhor já a atendeu há algum tempo.
- Tudo bem, minha senhora; irei em seguida.
E lá fui eu sonolento, semi-dormido, meio acordado.
Encontrei facilmente a rua e a casa, pois já eram minhas conhecidas.
Interrogatório de praxe, exame clínico, hipótese diagnóstica....
Terapêutica! Explico aos familiares o estado da paciente, o prognóstico e as providências a serem tomadas de imediato.
- Pois não, Doutor; muito obrigada.
A orientação clínica foi seguida com presteza para socorrer a enferma.
Ao final, a clássica pergunta, formulada com extrema cortesia:
- Seus honorários, Doutor?
- Respondi com o mesmo tom delicado e cortês, pois a ocasião e a circunstância assim o exigiam.
- Um momento, por favor, doutor.
E minha nobre interlocutora se dirigiu a ouro compartimento, com andar suave e gracioso, qual um cisne a deslizar nas águas cristalinas de um lago.
Enquanto aguardava o retorno da gentil velhinha, lancei uma vista d’olho pelo ambiente. Vislumbrei curioso, a um canto da espaçosa sala, uma pequena lamparina, cuja luz mortiça bruxuleava, projetando sombras esvoaçantes na parede, que mais pareciam voláteis dançarinas em passos mágicos rodopiando por sobre os objetos artisticamente dispostos naquele canto da sala.
Aproximei-me a passos lentos pare melhor observar aquilo que me pareceu um santuário. Harmoniosamente colocados na parede, observei quadros com diploma, medalhas, comendas, placas de prata contendo inscrições de homenagens e agradecimentos, cujos textos não pude ler com detalhes pela escassez da iluminação.
Sobre uma pequena mesa retangular, um Malhete de prata, em pedestal de madeira de lei artisticamente trabalhada. Ao lado, também disposta em pedestal adequado, uma trolha em bronze reluzente. Em frente, um medalhão dourado no qual, estampada em relevo, destacava-se a letra G em esmalte azul, circundada pelo Compasso sobreposto ao Esquadro, ambos em polimento luzido e filigranados, que davam à peça uma nobreza singular.
Centrando todas as peças, do agora reconhecido relicário, um diploma de Mestre Instalado emoldurado com esmero requintado.
Já envelhecido pelo tempo implacável que em tudo deixou a marca indelével de sua passagem, todo o conjunto, como disse, era iluminado tenuemente pela lâmpada de azeite, colocada em posição tal que a sua luz se difundia harmoniosamente, emprestando a tudo um quê de respeitável austeridade.
Absorto no enlevo da contemplação, respeitoso e contrito quase em clima de meditação, não percebi a aproximação da gentil senhora.
- Gostou do meu santuário, doutor?....
Indagou-me ela com entonação receptiva.
Como ao despertar abrupto de um sono, senti-me um tanto embaraçado, como se fora um profano surpreendido ao tentar adentrar em recinto sagrado.
O tom suave, terno e bondoso das explicações que se seguiram, trouxe-me de volta à realidade, fazendo-me sentir seguro e compreendido pela curiosidade que me moveu à aproximação do local.
- Estes objetos pertenceram ao meu falecido esposo. Aqui estão em sua homenagem, como recordação de quem muito amou e foi amado.
Em rápidas pinceladas traçou-me o perfil do homem, do esposo, do pai e do amigo que se fora, deixando um vazio impreenchível em seu saudoso coração.
- Era uma pessoa admirável, doutor. Um ser humano extraordinário; um profissional exemplar, enfim, um santo homem.
- Deus levou para junto de Si o meu santo!
Acrescentou-me em tom amoroso, mas com firmeza. Por isso esta lâmpada votiva permanece acesa todo o tempo, dia e noite, iluminando as coisas que ele tanto prezou. Aqui venho nos momentos de desconsolo da vida, para meditar, orar e sentir a sua presença nestas coisas dele, cujo significado não entendo muito bem, mas as velo com respeito, até quando a ele me for unir novamente, se o Altíssimo me conceder a graça.
Depois de pequena pausa reflexiva, confidenciou-me a seguir, quase em sussurro, entre altiva e circunspecta:
- Era Maçom, doutor. Ele era Maçom!....
Profundo silêncio meditativo, como se naquele instante tivesse sido desvendado um profundo mistério, um segredo impenetrável tivesse se revelado.
Repetiu-me ela com voz enternecida, mas segura e contrita, como a reviver um passado de ternura e bem-querência:
- O meu amado era Maçom!....
Tive o ímpeto de envolvê-la em carinhoso abraço e chamá-la de Cunhada, tal o enlevo com que proferiu a frase.
Detive-me respeitoso e silente, para não macular a sublimidade do momento, nem merecer a revelação confidente.
(Longa pausa reticente)
- Obrigado senhora, por me permitir participar deste momento de ternura e carinho, disse-lhe eu, em tom emocionado e embargo na voz, mas contido.
Tomei as suas mãos entre as minhas, quase em atitude de oração, e beijei-as suave, terna e respeitosamente, mas ainda contido.
Uma lágrima furtiva indiscreta me traiu!.... Como pérola sem jaça, foi engastar-se entre seus dedos.
Eu e ela contemplativos, em silêncio envolvente.
Depois de algum tempo, com um leve meneio de cabeça, como se faz em Loja, retirei-me sem dizer palavra.
Mas que palavras, Meu Deus?...
Acaso haveria palavras a serem ditas naquele instante de sublimidade?....
Só o silêncio foi capaz de traduzir o diálogo de sentimentos e emoções que entre nós se estabeleceu.
Ao pé da porta voltei-me e, com um leve aceno de mão, despedi-me daqueles dois santuários.
Um vivo, a minha frente, a iluminar o tremor da noite com a luz de seus olhos, com a aura da sua santidade, com o esplendor do seu sorriso.
O outro, revivido e perpetuado no simbolismo ‘daquelas coisas’, relíquias sacrossantas de um passado e de uma vida exemplar, iluminadas a um canto da sala.
- Era maçom!....
- Foi Maçom!....
É maçom! Pois a Maçonaria é a luz sublime que alumia os caminhos do eterno existir.
Meus Irmãos:
Que a sabedoria de Salomão nos inspire, que a Força de Hiram, Rei de Tiro, nos mantenha e que a beleza do Mestre Adonhiram adorne os nossos pensamentos, as nossas palavras, gestos e atitudes, para que possamos passar essa IMAGEM da Maçonaria, na vivência de todos os instantes do cotidiano de cada um de nós.
Assim Deus nos ajude!
Luís Augusto dos Santos, M\M\ Deputy of the Grand Master in District N° 45 da M.’. R.’. Grande Loja Maçônica do Estado de Goiás/Brasil.
Inefável Loja de Perfeição "Obreiros da Paz" - Vale de Uruaçú/Goiás/Brasil
ARLS Luz da Mantiqueira, 121- Or.’. de Niquelândia/Goiás/Brasil.
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