Vivendo em Israel há cinquenta anos, Leon Zeldis,
Cônsul Honorário do Chile em Tel Aviv, já ocupou o mais alto cargo da Maçonaria
israelense. Ele assinala que não existe impedimento entre o Judaísmo e a
Maçonaria. E mais: rabinos e hazanim (oficiantes cantores das sinagogas)
pertencem a Ordem, e na cidade de Eilat, no extremo sul do país, na fronteira
com o Egito, uma loja maçônica chegou a funcionar em uma sala da Yeshivah
(escola religiosa para formação de rabinos). “A Maçonaria Israelense é um
exemplo de convivência e tolerância”, destaca Zeldis. “O que procuramos mostrar
é que é possível conviver, judeus, árabes e cristãos, como irmãos.” Existem
várias maneiras de ajudar ao próximo. Ser maçom é uma delas. Para Leon Zeldis
Mandel, 80 anos, título de “Grão-Mestre, Soberano Grande Comendador, Grau 33”,
a Maçonaria não melhora o mundo, mas os maçons, sim. Nascido na Argentina,
Zeldis viveu no Chile, formou-se engenheiro têxtil nos Estados Unidos e fundou,
em 1970, a primeira loja maçônica de Israel de língua espanhola. Escritor,
poeta e conferencista, é autor de 15 livros e de mais de 150 artigos e ensaios
publicados em diversos idiomas. Seus livros, "As Pedreiras de
Salomão", "Estudos Maçônicos" e "Antigas Letras" foram
traduzidos para o português. Também é membro honorário da Academia Maçônica de
Letras de Pernambuco. Residindo em Israel desde 1960, Zeldis foi presidente do
Supremo Conselho do Rito Escocês Antigo de Israel. Suas atividades como
conferencista e profundo conhecedor da história da Maçonaria o levaram às
principais cidades da Europa e do continente americano. No Brasil participou do
Congresso Internacional de História e Geografia Maçônica, realizada em Goiana
(1995). Foi distinguido como membro honorário dos Supremos Conselhos da
Turquia, Itália, França e Argentina. Com dois mil membros, a Maçonaria em
Israel foi oficializada em 1953, mas desde o século XIX os maçons estão na
Terra Santa. Em 1873 foi instalada a primeira loja regular em Jerusalém.
Depois, em 1890, outra loja foi constituída em Jaffa. Atualmente, setenta lojas
funcionam em Israel, desde Naharía, ao norte, até Eilat, com um número
apreciável de irmãos árabes (cristãos e muçulmanos), funcionando em seis
idiomas, além do hebraico e do árabe. Em 2007 mantive contato com Zeldis que
falou um pouco mais sobre a Maçonaria e os judeus. A Maçonaria existe desde os tempos de Moisés ou é ainda mais
antiga?
As lendas maçônicas estão baseadas na época da
construção do Templo de Jerusalém pelo rei Salomão e depois na sua reconstrução
pelos judeus que regressaram do exílio da Babilônia. Mas, para a Maçonaria,
tudo isso não passa de histórias mitológicas. O certo é que existiram na Europa
associações de construtores medievais (maçons operativos) e somente no século
XVII começaram a ingressar nas lojas pessoas que não eram trabalhadores de
construção. Finalmente, no início do século XVIII as lojas já eram totalmente
simbólicas (maçons especulativos). Depois da fundação da primeira Grande Loja
de Londres, em 24 de junho de 1717, a Maçonaria Simbólica e Especulativa se
propagou rapidamente pela Europa e por todos os países onde existia a liberdade
de consciência.
Quais sãos as principais atividades sociais e
humanitárias das lojas?
A Grande Loja realiza diversas obras de
beneficência, mas, além disso, cada loja se preocupa em fazer trabalhos que
sejam bons para a comunidade. Minha loja, “La Fraternidad 62”, de Tel Aviv (que
trabalha em espanhol), nos últimos anos tem enviado material médico a hospitais,
bicicletas a meninos etíopes e também fez uma importante doação para uma
instituição que cuida de crianças com problemas familiares. A Ordem também
financia bolsas de estudos para estudantes pobres e presta ajuda a instituições
de assistência aos cegos, entre outras ações. Em geral, a Maçonaria é pouco
conhecida em Israel, porque as nossas atividades beneficentes são feitas com
discrição, sem publicidade. Todavia, personalidades importantes da sociedade
israelense são ou foram, no passado, maçons, incluindo aí juizes, médicos,
prefeitos e outros. O fundador da escola agrícola Mikveh Israel (a primeira
escola agrícola judaica moderna implantada na terra de Israel, em 1870), Carl
Netter, era maçom, assim como também foram o prefeito de Haifa, Shabetay Levy (
trabalhou para o Barão de Rothschild e foi prefeito de Haifa entre os anos de
1940 a 1951) e Itamar Ben Avi (jornalista e escritor, ajudou a concluir o
Dicionário da Língua Hebraica). Todos são nomes de ruas em Israel. Não existe
nenhum impedimento entre o Judaísmo e a Maçonaria. Nós temos na Ordem rabinos e
hazanim, e o ex-Grão Rabino do país, Israel Lau (sobrevivente do campo de
concentração de Buchenwald), apesar de não ser maçom, assiste as nossas
festividades e realiza conferências em nossas lojas. Em Eilat, durante algum
tempo, a loja funcionou em uma sala da Yeshivah local. O rabino também era
maçom. Na história recente, os Rabinos Chefes da Inglaterra e da África do Sul
eram ambos maçons.
A Maçonaria israelense – seguindo a tradição das
lojas da Inglaterra e da Escócia - não tem nenhuma interferência na política. O
que procuramos demonstrar é que é possível conviver em paz, árabes e judeus,
tratando-se com afeto, como irmãos. Qual é a importância da cidade de Jerusalém
na Maçonaria? A cidade de Jerusalém e seu Templo têm um papel central nas
tradições maçônicas. Nas escavações realizadas nas bases do muro ocidental, o
arqueólogo Warren descobriu uma sala que acreditava ser um templo maçônico.
Outros arqueólogos têm contestado esta suposição, porém o fato é que no centro
da sala existe uma coluna de mármore branca que não chega ao teto, ou seja, não
tem nenhum propósito estrutural. Quando Warren explorou este recinto, havia
duas colunas, como nos templos maçônicos (o inglês Charles Warren conduziu
importantes escavações em Jerusalém, entre 1867 a 1870).
A Maçonaria ajudou na
Independência de Israel?
Existem certos aspectos dos Essênios, como o
processo de ingresso e a ordem nas reuniões, que guardam algumas semelhanças
com a Maçonaria, mas não existe nenhuma relação direta. Quase todas as palavras
de acesso e chaves secretas da Maçonaria são palavras hebraicas. Além disso, a
relação com o Templo de Jerusalém é fundamental na Maçonaria. No entanto, é
preciso dizer claramente que a Maçonaria não é uma religião e não está ligada
ao Judaísmo, a não ser por tradições que eu já mencionei e o uso de palavras
hebraicas. Como a Maçonaria avalia as campanhas transnacionais anti-Israel por
parte da mídia e ONGs de todos os tipos? A ignorância e o preconceito são
difíceis de combater quando são financiados por inimigos do progresso e da
democracia. O exemplo mais contundente de ignorância e fanatismo cego é o constante
uso do “Protocolos dos Sábios de Sião” para atacar tanto o Judaísmo como a
Maçonaria, apesar de que faz mais de um século que se demonstrou de forma
indiscutível de que se trata de uma fantasia anti-semita, baseada em um livro
de um escritor francês (Joly) e de um novelista alemão (Goedsche), escrita por
um agente da Okrana (polícia secreta do Czar), em Paris. Não importa quantas
vezes se tem demonstrado a falsidade do livro, mesmo assim ele vem sendo
publicado nos países árabes e em outras partes do mundo. Não há outro remédio
do que seguir contestando as mentiras - com a esperança de que a verdade
finalmente triunfe – e educando as novas gerações nos princípios de liberdade,
igualdade e fraternidade.
Desafios do Século XXI
Desafios do Século XXI
Em seu livro “Antigas Letras”, Zeldis defende
alguns aspectos que devem mobilizar a atenção da Maçonaria no século XXI, no
tocante a sua importante função na sociedade contemporânea. A ênfase na
educação (laica e maçônica) é vital, segundo Zeldis, para melhorar a sociedade
e o indivíduo. “A importância da educação está precisamente em adquirir a
capacidade de julgar, categorizar, classificar e avaliar a qualidade da
informação recebida, não somente pelo seu conteúdo textual, mas também do ponto
de vista ético e teleológico.” A simples transferência de informações pode se
constituir, na maioria das vezes, em um armazenamento de conhecimentos que
oprime e sobrecarrega o ser humano, impedindo-o de analisar e refletir sobre o
essencial, escreve Zeldis. E cita o filósofo alemão Friedrich Krause
(1781-1832), para quem a educação é algo que a grande parte das pessoas recebe,
muitos transmitem, mas muito poucos têm. “O que equivale a dizer que
muitíssimas pessoas sabem ler, porém são incapazes de reconhecer o que vale a
pena ler”, conclui o autor. Elaborada pela loja São Paulo 43 – fundada em 1945
e que desenvolve importantes projetos na área social - a listagem relacionando
os maçons ilustres de vários países inclui o nosso entrevistado, o portenho
Leon Zeldis, nesse grupo seleto de pessoas que “fizeram da virtude a sua
principal causa na vida.” Ao lado de José de San Martin, libertador da
Argentina, Chile e Peru. Entre os brasileiros, destacam-se os maçons Rui
Barbosa, D.Pedro I, Padre Diogo Antônio Feijó, Deodoro da Fonseca, Luiz Alves
de Lima e Silva (Duque de Caxias), José Maria da Silva Paranhos (Visconde do
Rio Branco), Carlos Gomes, Epitácio Pessoa, José do Patrocínio, Benjamim
Constant, Casimiro de Abreu, Joaquim Rabelo e Caneca (Frei Caneca), Oswaldo
Aranha, Nelson Carneiro e Evaristo de Morais. Em relação aos maçons de Israel,
dois nomes são listados: Menachem Begin e Itzhak Rabin, ambos
primeiros-ministros e ganhadores do Prêmio Nobel da Paz (1978 e 1994). O rei
Talal Hussein, da Jordânia, e Abd El-Kader, fundador do estado da Argélia, são
os maçons ilustres dos países árabes.
O Museu do Holocausto, em Washington (United States
Holocaust Memorial Museum), inaugurado em 1993 com a finalidade de preservar a
memória do mais trágico momento vivido pela humanidade no século XX, coloca à
disposição dos visitantes documentos e fotos que contam a história da Maçonaria
sob o regime nazista da Alemanha. A perseguição teve início em 1933, quando o
governo alemão emitiu decreto visando a dissolução voluntária das “lojas”. Um
ano depois, aquelas que ainda não tinham sido fechadas, foram forçadas pela
Gestapo (polícia secreta do partido nazista) a encerrar as suas atividades.
Ainda em 1934, outro decreto definia a Maçonaria como “hostil ao Estado” e
ilegal. Apertando o cerco, o serviço de segurança das SS (polícia nazista),
comandado por Reinhard Heydrich, criou um setor especial – a Seção 2/111 –
voltado para a aniquilação da Maçonaria e de seus membros. Uma campanha
difamatória ligando os maçons a teorias conspiratórias se estendeu por todos os
países da Europa sob o domínio da Alemanha Nazista. Em 1940, a França ocupada
declarou os maçons inimigos do Estado, pondo a polícia para vigiá-los e
prendê-los, e emitindo cartões de identificação semelhantes à estrela amarela
dos judeus.
É difícil saber o número exato de maçons mortos em
campos de concentração, porque muitos foram arrolados como opositores ao
governo ou associados aos focos de resistência ao nazismo nos países invadidos.
Atualmente, calcula-se que existem 6 milhões de maçons em 164 países (58% nos
Estados Unidos), sendo que o Brasil congrega, aproximadamente, 150 mil
distribuídos em 4.700 “lojas” de um total de 9 mil instaladas em toda a América
do Sul.
Fraterno Abraço
RuyR@mires.'.
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