terça-feira, 10 de julho de 2012

MAÇONARIA E SEUS FUNDAMENTOS FILOSÓFICOS























Nossa Augusta Ordem é uma instituição em que o filosofar é tarefa que requer todo o nosso interesse e reclama todo o nosso esforço. Em cada um de nossos símbolos, em cada página de nossos Rituais e em cada etapa da História Maçônica, temos sempre algum vestígio ou princípio de caráter filosófico. Não se pode ser Maçom autêntico sem adentrar ao estudo filosofia, especialmente no Grau de Companheiro.

Perguntaram, certa vez, a um filósofo: “Para que filosofia?” E ele respondeu: “Para não darmos nossa aceitação imediata às coisas, sem maiores considerações”. A primeira resposta às perguntas “O que é filosofia?” pode ser, pois, a decisão de não aceitar como óbvias e evidentes as coisas, as ideias, os fatos, as situações, os valores, os comportamentos de nossa existência cotidiana; jamais aceitá-los sem antes havê-los investigado e compreendido. Em outras palavras, distinguir o real do aparente.

A filosofia começa dizendo não às crenças e aos preconceitos do senso comum, e, portanto, começa dizendo que não sabemos o que imaginávamos saber. Por isso Sócrates, o patrono da Filosofia, afirmava que a primeira e fundamental verdade filosófica é dizer: “Sei que nada sei”.

Preliminarmente, busquemos conhecer suas origens. A palavra filosofia é grega, composta pela junção de duas outras: Philo e Sophia. Philo significa amizade, amor fraterno. Sophia que dizer sabedoria e dela vem a palavra sophos, sábio. Filosofia significa, portanto, amizade pela sabedoria, amor e respeito pelo saber. O filósofo é aquele que ama a sabedoria, que tem amizade pelo saber, que deseja saber.

Os Historiadores de Filosofia dizem que ela nasceu no século 7º e início do século 6º antes de Cristo, embora não seja um fato especificamente grego.

Em verdade, a Filosofia grega tem dívida com a sabedoria dos orientais, não só porque as viagens colocaram os gregos em contato com os conhecimentos produzidos por outros povos (sobretudo os egípcios, persas, babilônios, assírios e caldeus), mas também porque os dois maiores formadores da cultura grega antiga, os poetas Homero e Hesíodo, encontraram nos mitos e nas religiões dos povos orientais, bem como nas culturas que precederam a grega, os elementos para elaborar a mitologia grega que, depois, seria transformada racionalmente pelos filósofos.

É que os gregos imprimiriam mudanças de qualidade tão profundas no que receberam do Oriente e das culturas precedentes, que até parece ter criado sua cultura a partir de si mesmos. Dessas mudanças, podemos mencionar algumas que nos darão a ideia da originalidade grega:

Os gregos transformaram em matemática (aritmética, geometria, harmonia) o que eram expedientes práticos para medir, contar e calcular; transformaram em astronomia (conhecimento racional da natureza e do movimento dos astros) aquilo que eram práticas de adivinhação e previsão do futuro; transformaram em medicina (conhecimento racional sobre o corpo humano, a saúde e a doença) aquilo que eram práticas de grupos religiosos secretos para a cura milagrosa das doenças.

Os gregos, diante da herança recebida, inventaram a ideia ocidental da razão como um pensamento sistemático que segue regras, normas e leis de valor universal, isto é, válidas em todos os tempos e lugares. Assim, por exemplo, em qualquer tempo e lugar 2+2 será sempre igual a 4; o triângulo terá sempre três lados; o Sol sempre será maior do que a terra, ainda que pareça menor do que ela etc.

Os gregos não inventaram apenas a ciência ou a filosofia. Mas inventaram também a política (palavra que vem de polis, que, em grego, significa cidade organizada por leis e instituições), instituindo práticas pelas quais as decisões eram tomadas a partir de discussões e debates públicos e eram adotadas ou revogadas por voto em assembleias públicas; estabeleceram instituições públicas (tribunais, assembleias, separação entre a autoridade do chefe de família e autoridades pública, entre autoridade político-militar e autoridade religiosa) e, sobretudo, criaram a ideia da lei e da justiça como expressão da vontade coletiva pública e não como imposição da vontade de um só ou de um grupo, em nome de divindades.

Analisemos a Filosofia grega em seus dois primeiros períodos: o pré-socrático, ou cosmológico, e o socrático, ou antropológico.

Os principais expoentes do período cosmológico foram Tales de Mileto, Pitágoras e Parmênides. Como principais características dessa época, podemos destacar a explicação racional sobre a origem, ordem e transformação da natureza, da qual os serem humanos fazem parte; a afirmação de que “nada vem do nada e nada volta ao nada”, isto é, que o mundo (cosmo) ou a Natureza é eterno; que nada se cria ou tudo se transforma sem jamais desaparecer; e a afirmação de que todos os serem além de serem gerados e serem mortais estão em contínua transformação, sem por isso perder sua ordem, sua forma e sua estabilidade. A mudança – nascer, morrer, mudar de qualidade ou de quantidade – chama-se movimento. E o mundo está em movimento permanente.

Já o filósofo Sócrates, considerado o patrono da Filosofia, propunha que antes de querer conhecer a Natureza e antes de querer persuadir os outros, cada um deveria primeiro, conhecer-se a si mesmo. A expressão “conheça-te a si mesmo”, gravada no pórtico do Templo de Apolo, patrono grego da sabedoria, tornou-se a divisa de Sócrates.

Por fazer do autoconhecimento ou do conhecimento que os homens têm de si mesmos a condição de todos os outros conhecimentos verdadeiros, é que se diz que o período socrático é antropológico, isto é, voltado para o conhecimento do homem, particularmente do seu espírito e de sua capacidade para conhecer a verdade.

O retrato que a história da Filosofia possui de Sócrates foi traçado por seu mais importante aluno e discípulo, o filósofo ateniense Platão. Segundo ele, Sócrates era um homem que andava pelas ruas e praças de Atenas, pelo mercado e pela assembleia, indagando a cada um: “Você sabe o que é isso que você está dizendo?” “Você acha que conhece realmente aquilo em que acredita aquilo em que está pensando, aquilo que está dizendo?” “Você diz”, falava Sócrates, “o que a coragem é importante, mas o que é a justiça?” Você acredita que a justiça é importante, mas que é a justiça? Você diz que ama as coisas e as pessoas belas, mas o que é beleza?

Sócrates fazia perguntas sobre as ideias, sobre os valores nos quais os gregos acreditavam e que julgavam conhecer. Sua perguntas deixavam os interlocutores embaraçados, pois quando tentavam responder, descobriam surpresos, que nunca tinham pensado em suas crenças, seus valores e suas ideias.

Mas o pior não era isso. O pior é que as pessoas esperavam que Sócrates respondesse por elas ou para elas, mas Sócrates, para desconcerto geral, dizia: “Eu também não sei, por isso estou perguntando”.

A consciência da própria ignorância é o começo da Filosofia. O que procurava Sócrates? Procurava a essência verdadeira da coisa, da ideia, do valor. Procurava o conceito e não a mera opinião.

Qual a diferença entre uma opinião e um conceito?

A opinião varia de pessoa para pessoa, de lugar para lugar, de época para época. É instável, mutável, depende de cada um, de seus gostos, e preferências. O conceito, ao contrário, é uma verdade intemporal, universal e necessária que o pensamento descobre, após análise racional, reflexão isenta de preconceitos e pela prática da meditação.

Ao fazer suas perguntas e suscitar dúvidas, Sócrates fazia os atenienses pensar, não só sobre si mesmos, mas também sobre a polis. Aquilo que parecia evidente acabava sendo percebido como duvidoso e incerto. Para os poderosos de Atenas, Sócrates tornara-se um perigo. Por isso, eles o acusaram de desrespeitar os deuses, corromper os jovens e violar as leis.

Levado perante a assembleia, Sócrates não se defendeu e foi condenado a tomar um veneno – a cicuta – e obrigado a se suicidar. Por que Sócrates não se defendeu? “Porque”, dizia ele, “se eu me defender, estarei aceitando as acusações, e eu não as aceito. Se eu me defender, o que os Juízes vão exigir de mim? Que eu pare de filosofar. Mas eu prefiro a morte a ter de renuncia à Filosofia”. Essa narrativa consta da obra Apologia de Sócrates, isto é, a defesa de Sócrates feita por seus discípulos, contra Atenas.

Ao longo da história, o pensamento filosófico percorreu os mais variados caminhos, seguiu interesses diversos, elaborou muitos métodos de reflexão e chegou a várias conclusões, em diferentes sistemas. É verdade que muitos desses sistemas filosóficos e até mesmo religiosos tidos como doutrinas verdadeiras acabaram por se tornar equivocados, na medida em que se arrogaram detentores exclusivos da Verdade, surgindo daí os dogmas, isto é, os pontos indiscutíveis de qualquer doutrina ou sistema, que devem ser aceitos sem exame e sem crítica.

Ocorre que a Verdade, esse mistério inatingível, que nos atrai com força irresistível, é muito vasta, muito vivaz, muito livre e muito sutil para deixar-se prender, imobilizar e petrificar na rigidez de um sistema filosófico. Cada ser humano detém a sua verdade, que é a concepção do momento em torno de um assunto, problema ou equação. As verdades científicas, então, são as mais mutáveis. Basta lembrar que em determinado momento da história da humanidade acreditava-se que a Terra era quadrada. Em outra época, que ela era o centro do Universo, com os demais planetas girando em seu redor.

Tudo isso nos leva a concluir que a Verdade Absoluta é algo inatingível, é uma abstração. Aliás, a essência da Filosofia não é a verdade absoluta, senão a busca da mesma, o que o Maçom faz, incessantemente, a partir da Iniciação. O saber filosófico maçônico nunca está findo ou concluso, pois filosofar é buscar o saber. As perguntas têm, na filosofia maçônica, maior importância que as respostas, pois, valendo-se do valor dos símbolos, toda resposta provoca e gera outra pergunta.

Uma fórmula moderna do que se deve entender por filosofa é conversar consigo mesmo, refletir sobre os próprios pensamentos e meditar para, finalmente, encontrar a sua verdade. São atividades interiores cujos resultados tem se revelado dos mais promissores, posto que brota e floresce da própria consciência. Infelizmente, a atividade filosófica não surge para todos os Maçons, nem se faz presente no momento da Iniciação, uma vez que nem todos estão sintonizados com esses valores.

Essa flexão corre porque o homem vive submerso e afogado na vida puramente substantiva e animal, ocupado em satisfazer suas necessidades vitais. Essa maneira de viver é fomentada, na atualidade, pelo mundo da ciência e da tecnologia. Somos escravos do relógio.

Trabalhamos como máquinas, obedecemos cegamente a hábitos e rotinas, cumprimos atos triviais e sem sentido, desenvolvemos o ritual em Loja sem nos preocuparmos com o seu real significado. Não podemos “perder tempo” ouvindo um amigo, olhando as estrelas, brincando com uma criança ou vendo um por do sol.

Pitágoras contava três tipos de pessoas que compareciam aos jogos olímpicos, a festa mais importante da Grécia: as que iam praticar o comércio durante os jogos, ali estando apenas para servir a seus interesses, sem preocupação com os jogos ou com as disputas; as que iam para competir, isto é, os atletas e os artistas, pois havia também competições de dança, poesia, música e teatro; e finalmente as que iam para contemplar os jogos e torneios, para avaliar o desempenho e julgar o valor dos que ali se apresentavam. Esse terceiro tipo de pessoa, dizia Pitágoras, é o filósofo.

Com isso, Pitágoras queria dizer que o filósofo não é movido por interesses financeiros, não coloca o saber como propriedade sua, como uma coisa para ser comprada e vendida no mercado. Também não é movido pela competição, quer dizer, não faz das ideias e dos conhecimentos uma habilidade para vencer competidores ou atletas intelectuais, mas é movido pelo desejo de observar, contemplar, julgar e avaliar as coisas, as ações, a vida. Em resumo: pelo desejo de saber. A verdade não pertence a ninguém, ela é o que buscamos e está diante de nós para ser contemplada e vista, se tivermos olhos do espírito para vê-la.

O Maçom há de ser um filósofo, na medida em que deve amar a sabedoria, buscar incessantemente a verdade, ir além das aparências, combater a ignorância e os preconceitos, discutir ideias e não coisas, e, principalmente, refletir sobre o Enigma da Vida: “De onde viemos o que somos, para onde vamos?” Qual o verdadeiro sentido da vida? Qual o nosso papel na sociedade em que vivemos? Quais as nossas possibilidades, quais as nossas responsabilidades? Estamos colocando à Glória do Grande Arquiteto – e a serviço da humanidade – os talentos que Ele nos dotou? Estamos ajudando a construir uma sociedade mais justa e perfeita?



Fraterno Abraço
RuyR@mires.'.

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