Quando
iniciado na Maçonaria, muitos são os sonhos de realização, educação e cultura
que o neófito espera obter. Imagina-se que terá Mestres que lhe ensinarão todos
os meandros da Arte Real. Depois de algum tempo, ele percebe que a Ordem
Maçônica apenas fornece local físico, ferramentas e amigos para a caminhada que
fará a sua maneira e por seus próprios meios. O estudante Maçom anda só na
estrada do desenvolvimento, porque lhe cabe descobrir, decorrente da própria
vivência, por si e em si próprio, na devida oportunidade, as verdades tão
sonhadas. As descobertas intuídas pelo método maçônico de aprendizagem são
diferentes para cada pessoa, dependendo de sua herança cultural, porque o
método objetiva que cada um desenvolva suas próprias verdades, sem submetê-las
a um molde.
Esta liberdade de auto desenvolvimento tem conexão
com a teoria do conhecimento da antiguidade, na qual Heráclito afirmou que tudo
no universo muda constantemente, tudo é dinâmico. O método de ensino maçônico
transporta esta ideia para as verdades de cada um ao longo do tempo. Cada
pessoa tem verdades próprias, que mudam constantemente, dependendo apenas do
dinamismo de seu alicerce cultural.
Inicialmente,
é bem estranha a forma como cada ferramenta de pedreiro é apresentada, pois sua
utilização é universalmente conhecida na arte da construção civil. O processo
de conhecimento maçônico processa informações, manipulando símbolos, baseado em
regras ritualísticas. O que o neófito não dispõe, são as regras que lhe permite
utilizar estes mesmos utensílios do pedreiro de forma simbólica, na construção
do próprio homem. Dentro da teoria do conhecimento maçônico estes símbolos
são aplicáveis aos aspectos: moral, ético, social, das saúdes física, mental e espiritual,
e no conjunto de cada um. Platão afirmou que os homens comuns se detêm nos
primeiros degraus do conhecimento e não ultrapassam o nível da opinião;
matemáticos ascendem a um nível intermediário, e só o filósofo tem acesso à
ciência suprema. Para isto, o filósofo usa um processo conhecido por
dialética; passando de uma ideia para outra, sendo uma delas o complemento ou
alicerce da outra. O filósofo é em essência o dialético. A Maçonaria usa
de suas lendas e símbolos para proporcionar ao estudante um método de progresso
do pensamento filosófico; funciona também para obreiros, sem formação acadêmica
alguma, poderem tratar processos dialéticos complicados e com isto se
humanizarem. Estes exercícios dialéticos compõem a essência da formação do
conhecimento maçônico. O Maçom é um filósofo diferente, porque seus
processos cognitivos desenvolvem-se pela materialização da ideia na linguagem
simbólica, no uso de símbolos e lendas, que são convertidos em pensamentos
abstratos e complexos por métodos de associação e repetição. E isto faz a
Maçonaria produzir seres humanos inteiros, equilibrados e destituídos da
abordagem mecanicista que, ao fragmentar os processos, acaba por perder a visão
do todo. O maçom é treinado para ser a um só tempo nos planos espiritual, psíquico,
biológico, histórico cultural, social, físico, e outros. A fragmentação
transmitida pela educação profana, usando de disciplinas, impossibilita ao
homem aprender o que significa ser humano. É nisto que o método de ensino
maçônico leva vantagem. A diversidade de ideias, pelo fato de cada um observar
os processos a sua maneira, é a aplicação da teoria da complexidade, em
semelhança com um universo vivo que evolui da desordem para a ordem em graus de
complexidade crescentes. Quando a Maçonaria migrou da arte de construir
para a arte de pensar, no século XVIII, deu partida a um processo educacional
que veio até o presente, revolucionando a sociedade em seu caminho por ações
daqueles que foram treinados debaixo de sua filosofia. Desde então, e na
maioria dos eventos históricos onde se pautou por Liberdade, Igualdade e
Fraternidade, a Ordem Maçônica agiu nos bastidores com esta educação do homem
por inteiro e que move seus membros à ação. O homem Maçom torna-se mestre
de si próprio ao longo de seu auto desenvolvimento, e procura alcançar o ápice
da perfeição com a tomada de atitudes. Sem discutir, o Maçom age baseado na
moral que desenvolveu ao longo de sua jornada maçônica, e esta ação está
pautada no desejo de acertar e promover o bem para si e a coletividade. Nestas
ações, ele pode ser aviltado e até morto, porque não é sem perigo que um homem
de ação atua. Entretanto, na maioria das ocasiões ele se beneficia com esta
postura, caindo sobre sua pessoa o reconhecimento da sociedade que o rodeia, e
principalmente incrementa sua própria satisfação, alegria e felicidade. Nisto,
o Maçom é semelhante a um planeta que órbita o Sol; ele reflete a luz emanada
por intermédio da ação frente ao que ele considera certo. A educação do Maçom o
leva a conhecer o mal e também o modo de evitá-lo. A máxima em toda a caminhada
fundamentada na teoria do conhecimento maçônico é o autoconhecimento, o
“conhece-te a ti mesmo”, de Sócrates, e esta noção, como resultado de um
trabalho solitário e autodidata é decorrente de profunda introspecção, de longa
meditação. O interessante é que tudo o que se aprende nos Templos
maçônicos é baseado em lendas fictícias, porém alicerçados em fatos históricos
registrados. Assim como as ferramentas, as lendas são materializações de
conceitos abstratos, dentro da linha e em direção de estados de complexidade
cada vez maiores. Estas histórias sempre têm mensagens que impulsionam ao
desenvolvimento Moral. E como não se usam computadores para educar o homem
Maçom, ocorre enriquecimento espiritual e aporte de diversidade
cultural. Já que nada pode ser feito para melhorar a sociedade se no fundo
do cidadão não existir um cunho de homem espiritualmente desenvolvido e em
harmonia com o princípio criador do universo designado como Grande Arquiteto do
Universo, o homem Maçom considera a si mesmo um templo do Incriado, e tudo fará
para não conspurcar aquele lugar sagrado. É templo cujo limite é sua própria
pele, cujos portões são sua boca, ouvidos e visão, tudo regido por sua
capacidade cognitiva e emocional equilibrados pela sua espiritualidade. O
Maçom desenvolve sua espiritualidade para avançar com apoio daquilo que
considera a origem de tudo; sem uma elevada Fé ele se perderia nas sendas do
mal, à semelhança do que acontece na sociedade humana, na qual o homem fera
prevalece sobre o homem evoluído. E tudo é proporcionado por seu próprio
esforço e pelos princípios desenvolvidos com a técnica de aprendizado maçônico.
A criatura humana ao longo de sua vida deve se desenvolver de forma equilibrada
em todas as suas dimensões, e o que acelera o processo de desenvolvimento é uma
potencialidade latente em cada um: a capacidade de crescer em espiritualidade.
E cada pessoa desenvolve seus próprios critérios e ideias de divindade; o que
para alguns faz sentido e alimenta sua capacidade de evolução espiritual, para
outros não faz sentido algum. A epistemologia genética, formulada por
Piaget, ocupa-se com a formação do significado do conhecimento e meios usados
pela mente humana a sair de um nível de conhecimento inferior para outro
superior, mais complexo. Segundo ele, a natureza dos saltos do conhecimento são
históricas, psicológicas e biológicas. Ele explica que “a hipótese fundamental
da epistemologia genética é a de que existe paralelismo entre o progresso
completo e a organização racional e lógica do conhecimento e os correspondentes
processos psicológicos formativos”. Pode-se deduzir que o método maçônico
de progresso do conhecimento usa o lastro genético que cada um tem, e de forma
livre permite que cada um construa sua própria base sem espremer este dentro de
um modelo. Muitas das lendas contam histórias de personagens movidas à
ação, o que lhes trouxeram bons e maus resultados. No fundo, o trabalho em
mergulhar nos sentidos destas lendas é sempre o de estudar denodadamente para
desenvolver o poder de, em conhecendo o mal, saber evitá-lo. Estes estudos
são movidos principalmente pela curiosidade, a mola propulsora do
desenvolvimento intelectual. O desejo intenso de ver, ouvir, conhecer,
experimentar alguma coisa geralmente nova, original, pouco conhecida ou da qual
nada se conhece, faz vencer barreiras, escalar níveis de conhecimento
superiores, em níveis de complexidade sempre maiores, contribuindo para fazê-lo
possuidor dos segredos do mal, a fim de desviar-se com galhardia de sua ação
corrosiva e destruidora. É apenas pelo estudo levado pela curiosidade salutar e
edificante que o Maçom obtém sucesso em subjugar a natureza e passa a
desfrutá-la em sua plenitude.
Em contrapartida, o que também favorece o
desenvolvimento pessoal é o controle da indiscrição. O Maçom ouve mais e age
mais do que fala. Pela curiosidade e longe da bisbilhotice que induz ao perigo,
desenvolve a capacidade de manter segredos, a nunca falar de assuntos de outros
ou repassá-los sem sua anuência.
A vida em
sociedade impõe a necessidade de politização, desenvolvimento do exercício do
poder em favor da coletividade. E sendo o humano um ser social por excelência,
a sociedade não funcionaria de forma equilibrada sem o exercício do poder de
forma equitativa e livre sem a política. Aí o desenvolvimento filosófico
maçônico tem sua mola mestra ao impulsionar pessoas a pensarem e agirem mais.
Lideranças são forjadas no fogo da convivência em lojas. De nada adianta
revelar os segredos maçônicos por meio de livros com objetivo meramente
comercial se não se oferecer a oportunidade da pessoa viver a Maçonaria, e não
possibilitar que a maçonaria penetre nela. Pela política, o poder é concentrado
de forma natural, pelo convencimento com argumentos da razão e pela formação de
relacionamentos fortes. Platão detratava o retórico e o considerava mentiroso,
pois este usa o poder do convencimento para a adulação e adulteração do
verdadeiro, e adicionalmente, o tinha como crédulo e instável. Segundo Platão,
poetas e retóricos estão para o filósofo no mesmo nível em que está a realidade
para as imitações da verdade. Por ser uma coletividade diminuta, cada loja
cobra imediatamente resultado da liderança. Não existe espaço para ações
evasivas e dissimuladas como é comum observar-se na sociedade. Sentar no trono
de Salomão, antes de ser privilégio que destaca e enaltece, é ato de fé, lição
de humildade, exercício de real de política como ela deveria ser executada no
mundo externo. O cidadão forjado nestas oficinas filosóficas vai certamente
mudar e passa a praticar a política honesta, no exato sentido que Platão e
Sócrates deram a tão nobre profissão. O Maçom não faz da filosofia a
finalidade de sua própria vida, mas usa da filosofia maçônica para especializar
sua capacidade cognitiva e emocional no exercício da Política. A Maçonaria é
uma escola de política, pois com sua filosofia e sua organização desenvolve-se
a verdadeira política. Foi Platão o primeiro a estabelecer a doutrina da
anamnese, que é a lembrança de dentro de si mesmo das verdades que já existem a
priori, em latência. O conhecimento maçônico, alicerçado em suas simbologias e
lendas, é um exercício permanente de anamnese. E fica tão fácil deduzir
verdades complexas latentes que não há necessidade alguma de frequentar escola
superior, basta viver o dia-a-dia maçônico que estas verdades afloram
naturalmente, como se sempre estivessem plantadas na mente e no coração a
priori. É aí que nasce o verdadeiro homem politizado. Este não busca um
ganha-pão com este conhecimento, mas pela ação busca exercer a verdadeira
atitude política, para tornar-se pedra polida dentro da sociedade ideal. Uma
pedra cúbica que não rola ao sabor dos fluxos dos manipuladores como se fosse
um seixo rolante de fundo de rio, por ter desenvolvida a capacidade de pensar,
é um obstáculo para os políticos despóticos e desonestos. O aspecto
emocional deve ser alimentado com frequentes distrações, para permitir à mente
descansar e se refazer para novas investidas na arte de pensar. Durante os
períodos de devaneio pode ser desenvolvido o ócio criativo; usar o tempo de
folga para criar e desenvolver ideias ou coisas apenas para o deleite
emocional, mas que também propiciem crescimento.
Russell propôs que o ócio poderia ser acessível a
toda a população se modernos métodos de produção fossem aplicados, para ele, o
trabalho, tal como o conhecemos, não é o real objetivo da vida. De Masi diz que
a sociedade industrial permitiu que milhões de pessoas atuassem apenas com os
corpos e não lhes deu liberdade de se expressarem com a mente.
O que se faz
nos templos maçônicos é exatamente esta retomada da capacidade de pensar que o
mundo pós-industrial impôs. Só que na Maçonaria ninguém é compelido só a
pensar, mas também de sentir e interpretar toda a mensagem maçom dentro de seu
nível de entendimento. Interagem diversão, trabalho, sentimentos e misticismo.
Mesmo após as sessões, nos ágapes festivos o processo de construção continua, é
quando se discutem livremente todos e quaisquer temas da vida. As emoções fazem
parte do homem, principalmente aquelas que disparam o gatilho da racionalidade.
É em momentos de lazer que a maioria das ideias são forjadas, haja vista que
elas parecem já existir a priori e nos saltos para níveis superiores de
conhecimento, para níveis de complexidade maiores, são então apenas
“lembradas”.
Muitas vezes o pensador passa dias em profunda
meditação para buscar solução a um problema de forma intensa e sem descanso;
basta-lhe um momento de descontração, e o cérebro expele a solução para aquilo
que jazia incógnito e insolúvel até então. Outras vezes o pensamento é inédito,
não existe registro de haver sido pensado anteriormente, na maioria das vezes
ele é despertado em momentos de descontração por um símbolo, por uma estória ou
lenda; de repente a ideia está ali, num estalo. A mola da teoria de
conhecimento maçônico é seu paradigma da complexidade, a curiosidade salutar em
avançar cada vez mais nos conhecimentos de trabalhar a Arte Real em benefício
da humanidade, sempre com frequentes intervalos de laser entre cada investida.
É devido a este conjunto harmônico da metodologia
maçônica que ela tem sucesso em lapidar com um mínimo de esforço os seres
humanos de uma pedra bruta e tosca em pedra polida e cúbica, onde cada um ocupa
seu espaço na sociedade humana de forma esplendorosa nas colunas e paredes do
grande templo da humanidade para honra e à glória do Grande Arquiteto do
Universo.
Fraterno
Abraço
RuyR@mires.'.
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